21/09/2008

O DIA " D " DA ALMA APAIXONADA

O DIA D DA ALMA APAIXONADA
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O dia amanheceu cinzento, o que não impedia que uma alegria excitante lhe comprimisse o peito e o pensamento. Cantarolou no banho, em Inglês para não perceber o sentimento das palavras que assim soavam a frio. As mãos deslizando sobre o seu corpo, em movimentos voluptuosos, sobre os seios, o sexo, as pernas bem delineadas, o ânus e tudo a excitava como nunca antes e a inquietava, porque não era de sexo a inquietação, era de paixão.
Estava magnifica e o sorriso aberto, os olhos brilhantes de emoção, o vestido azul escuro orlado a branco nas mangas curtas e no decote acentuado que deixava a evidência sedutora dos seios firmes e harmoniosos como conjunto.
A alma suspensa do lado de fora do seu corpo, acentando que sim, que estava bela e podia confiar que de dentro de si, tudo era perfeito, a decisão de participar na festa, de se encontrar com a alma agora em corpo que a provocara apenas através de palavras e que se fora tornando uma presença forte no interior de todo o seu ser. Era como se a tivesse escolhido, a ela Cristina, sem a saber ou sabendo-a, por absurdo que pareça, a arrastasse.
O esconde esconde acabara, se ele tivesse a coragem de aparecer como dissera.
Incomodava-a que estivesse rodeada de amigos e amigas. Preferia,talvez um encontro mais romântico onde pudesse dar liberdade a toda a compressão por meses e meses de quase asfixia emocional. E entregar-se finalmente, saciar de si e dele toda a a virtualidade do desejo.
É verdade que pelo caminho houve um desencontro, como que uma raiva exacerbada pelo desprezo que sentira na recusa dele em se encontrarem no auge da paixão.
O outro por quem julgara apaixonar-se, ou quisera apaixonar-se em oposição, tinha um estilo parecido na distância, tinha no amor expresso nas palavras, a mesma sensação de absoluto que ela encontrara no amante suspenso, tanto que a confundira e deixara-se enredar e enredara, em palavras sublimes que nunca até então dissera a mais ninguém e ele cantara-a como ela gostava de ser cantada e fizera dela um outro ser, dera-lhe uma outra dimensão que ela possuía amordaçada. Mas quem ela amava, a sua alma a induzia era o que tinha mais afinidades com o seu sonho de mulher.Seria?...
Bateram à porta do quarto do hotel e sentiu um tremor de dentro da alma. Era a Vitória, por certo. Combinaram que a levaria de carro até ao local da festa. Foi ver. E era.
A Vitória era uma amiga de corpo e alma, inteira. Toda ela irradiava alegria, se bem que os olhos, de um castanho diferente, âmbar cristalino, encobria algo que parecia tristeza, mas o sorriso, as gargalhadas esfuziantes que soltava, onde só um sorriso bastava, faziam da sua companhia um elixir de boa disposição.
- E então? Preparada? Cristina olhou-a entre surpresa e agradecida. Só ela sabia desta paixão que a consumia nos dias de silêncio entre si e a alma, diálogos surdos com imagens distorcidas. Olhou-a nos olhos e sorriu.
_Há meses que espero este dia. Tenho tudo resolvido no interior de mim. Sei que o quero fazer...
O local, fora do bulicio da cidade, era aprazível, quase paradisíaco. Pelo caminho foi atendendo chamadas enumeras de amigos e amigas que já tinham chegado ou que iam a caminho, indagando se sempre chegara a tempo, se estava demorada, trocando felicitações mutuas.
Cristina sentia-se a rainha da festa. Seria uma festa dentro da festa. E estava bela, superiormente bela, porque a expectativa de felicidade torna as pessoas ainda mais belas.
Havia gente que falava e ria do lado de fora da sala onde iria decorrer a conferência
Amigos, amigas, desconhecidos e ele. Lá estava, a figura exaltante da paixão, o homem cujo sentido das palavras a prendera, a transbordara da alegria de ser possível encontrar o príncipe vindo das trevas envolto em brumas cativantes. Agarrou com força o braço de Vitória, como se vacilasse e seguiu determinada.
Cumprimentou todos os amigos, os olhos dela húmidos das pulsações aceleradas do coração e fixos na imagem do ser amante, a figura benéfica do seu corpo que se movia em volta da mesa dos bolinhos e canapés. A graciosidade com que pegava no copo do aperitivo. Alto e bem parecido.
_Cristina, estás linda, mulher, espero que questiones o orador com algumas das tuas máximas infalíveis.
_Ana Maria, não me provoques. Vou dizer-te ao ouvido para não melindrar as outras. Tu sim, és a mais linda da festa e já sabes que vim para conviver, aprender, amar de todos vós e ao vivo. Eu sei tão pouco....
Viu-se rodeada de todos eles, como íman que atrai, poderoso e belo. E ria-se. Cristina
Quando por fim lho apresentaram, foi Vitória que já o conhecia, que lhe propusera a ele a apresentação formal e ele acedera, alto, espadaudo, o cabelo grisalho, curto, sorriso enigmático e os olhos perspicazes de falcão real que aquilata do valor da presa. A sua voz soou quente e terna,sem tremor, confiante.
_Há muito que ansiava conhecer-te. Sou o Samu.
As mãos dele nas dela, quentes e húmidas, as dela que tremiam e a voz de Vitória a dizer que apertos de mão já não se usam a incentivá-los ao beijo, ainda que nas faces, a permitir que se cheirassem.
_E eu a ti...Eu sei...
Trocaram beijos lentos nas faces e tocaram-se. Ela sentiu o orgasmo que desde há instantes se perfilava no limite do possivel para se expandir, se soltar de si, das entranhas que estremeciam a cada batidela descompassada do coração. Teve um desejo louco de o apertar de encontro ao seu peito arfante, mas conteve-se ou foi contida por Vitória que a levou pelo ombro, para que entrassem que a sessão estava prestes a começar.
Cristina sentou-se no lugar com o seu nome e a seu lado Vitória e do outro lado de si, Ana Maria, perto, um pouco triste, a aperceber-se da teia que se desenhava, o companheiro de estudos, embevecido da figura dela e talvez perfilado na expectativa de beber um pouco do seu suco amoroso, Pedro Ramires, um homem de um humanismo transbordante em tudo o que tocava.
O orador, cientista da palavra e do comportamento humano, reconhecido mundialmente pelas suas ideias sobre o condicionalismo do individuo face ao e em face do cosmos, extrapolando do cognoscível para o imaginário reflectido em inúmeras experiências com cobaias de pensamento livre, estudos da mente e das almas que se manifestavam em cada vez maior número no sentido do que profetizava.
Cristina fixa no orador e na figura de Samu, o homem da sua vida que se sentava duas filas à frente da sua, erecto na postura que denotava atenção e distanciamento.
Queria ouvir o orador, por vezes alguém a pisava para que despertasse, vendo-a aérea. como não estando no lugar mas em outra instância da razão.
Pelo seu cérebro só dava Samu. A voz dele a seduzi-la. Tudo o que ele representava na sua vida. As cartas em que falaram apaixonadamente do dia em que se encontrassem para se terem. Os projectos a dois onde ela se encaixava perfeitamente como sonhara desde sempre. A aquiescência das almas em sintonia de vontades. O aroma do seu corpo, os seu olhos. Uma dúvida, os olhos ao vivo pareceram-lhe frios, diferentes das fotos sem brilho nem vida. Talvez fosse da surpresa do momento.
A sessão estava agora numa fase de perguntas. Pedro Ramires interrompeu-a, nos diálogos com a alma, para lhe dizer.:_Cristina, que foi que disseste?
_Eu?!...Não disse nada.
_Fizeste uma pergunta, a sala está parada à espera porque não foi muito perceptível.
Fez-se escarlate por sobre a pele morena. Falara, dissera algo?... Só podia ser a tal força de dentro dela que se evadira no silêncio dos pensamentos e conjecturas que fazia. Viu os olhos dele que a fixavam, duas filas à frente. Samu...Julgou que sorriam, os olhos dele.
_A essência. Há um momento em que se subdivide, se reparte em aspectos de alma.
E voltou ao silêncio de ouvinte. O orador explicou, explicitou, sorriu e contou uma metáfora Índia.
_No silêncio das almas, nem "Manitu" ousa entrar...
A sessão, aguardada com tanta expectativa, estava a tornar-se dolorosa. Nem mesmo a pausa para o almoço e em que Samu se juntou ao seu grupo de amigos e falaram apressadamente de assuntos triviais, agora triviais. Os olhos cúmplices a traírem-se dos outros que os viam, surpresos a indagarem ....
continua...


É o que me proponho. Escrever sobre vidas anónimas que valem as luzes da ribalta ou a fixação histórica e que traduzem a essência de um povo. Primeiro de uma família. Primeiro ainda, ou antes de tudo, a essência de um homem, de uma mulher.
Escreverei por encomenda, preços de acordo com extensão e pesquisa de documentação. Mas com a paixão que o percurso proposto me suscitar.
Aguardo a vossa proposta.

J.R.G.

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