27/10/2009

CARTA POEMA A UMA AMIGA DESESPERADA

cruzada sobre o regaço cada mão
veias vincadas que traçam o destino
os olhos que de dentro perguntam a razão
se é por ser mulher que há tal desatino

há ligações que por mais esforço nunca dão
almas avessas rebeldes de insubmissas
procurando no amor a amizade trazem paixão
que é um estado hipnótico de sensações postiças

atravesso a luz rutilante dos teus olhos castanhos
estremecemos da alma os corpos quando toco os teus lábios
e sinto o calor de dois fogos ardendo estranhos
o dos olhos que me perfura a essência de tão sábios
e o outro fogo de dentro da existência fogos tamanhos
de tal sorte que me arrepia a nostalgia dos contágios

dizes que vives sete vidas de vadia à revelia
que nada deu ou dá certo em teu projecto de viver
amores furtivos desencantos que te deixam na agonia
de ter de recomeçar de novo tua ânsia de saber

hoje olho o teu corpo pela primeira vez na totalidade
adejando em volta vejo a tua alma bela graciosa
e não encontro um rasto uma evidência de casualidade
talvez de estranhos a vã cobiça que te cerca a alma carinhosa

é tempo de uma paragem nesta correria alucinante
a vida é ainda em ti do tamanho duma criança
sentir no vazio que aparentas do teu ser pensante
um todo que aguarda o reconhecimento da esperança

é falso que tenhamos montes de amigos sempre à mão
amigos é algo mais que um simples sorriso em horas difíceis
entram em nós com tudo incluindo a mente o coração
os outros desfalecem ausentes nos momentos impossíveis

toda a vida é uma luta injusta pela sobrevivência
uns investem o corpo em desmedida outros o espírito
não é liquido que a alma assuma a insolvência
quando é no corpo que se concentra todo o mérito

eu por exemplo que investi na alma uma vida inteira
não tenho nada no corpo que ao ser da alma me enriqueça
sei que num corpo avulta a carne a pele alva ou trigueira
é certo que cedo ou tarde acorda sem ter quem o aqueça

hoje que te conheci o corpo são da alma enigmática
achei que eras mais bela do que só pela alma imaginava
exorto a menina flor jardim ou estrela que há em ti mulher
na génese do ser em que te moldas tantas vezes pragmática
refulge uma luz de amor que já em ti sempre brilhava
"amigos cento e dez ou talvez mais" , não é quem quer


autor: JRG

24/10/2009

A FLOR MAIS BELA

tive um jardim com as mais belas flores
cores maviosas de perfumes sublimes
de entre elas pétalas dúctis meus amores
uma era a evidência da deusa de Aquiles

alguém a transformou desistiu de mim
eu que a tinha como a mais bela e pura
sorrio hoje que a vi triste entre a rosa e o jasmim
e tal como a imaginei mulher flor menina de ternura

ao vê-la, há tanto tempo que a procurava,
a minha alma vagabunda se emocionou
o ar descontraído, lábios carnudos as mãos que amava
pendentes de um sorriso lindo que me cativou

corri em volta de mim e além no mundo
porque a senti amiga da alma não a queria perder
na solidão do homem que eu sou o mais profundo
amiga era esta flor que amei de amiga sem a conhecer

hoje que a vejo enfim despida e eu a nu deslumbrado
do encanto dos olhos seus, entre sorrisos de alma, rutilantes
tinha que escrever espontâneo este poema endiabrado
ode à beleza da flor mais bela viçosa de sol e lua amantes

autor: JRG

17/10/2009

NA VILA ONDE EU MORO

na vila onde eu moro
vejo a outra margem do rio
há uma rua de escarros sem decoro
vejo de Lisboa imponente o casario

a rua desce desde o largo da igreja
até ao rio com Lisboa à vista
chão escuro laivos de muco para que se veja
que escarrar no chão aqui é uma conquista

dum lado casas de pasto humano
do outro ninhos de gente que na vila habita
sentados no chão velhos de olhar insano
no lusco fusco da vida que a morte regurgita

na vila onde eu moro
nem tudo é morto ou escarro
há natureza e o rio na base do morro
e gente feliz que se ri em cada bairro

há marchas maledicências romarias
homens de senso raro mulheres belas bonitas
há sábios que lêem no céu as ventanias
e cães abandonados por famílias catitas

no rio arrastar ameijoa pesca violenta
entre outras pescas duras ancestrais
na margem meninos de escola e gente que acalenta
no ar adejando gaivotas mergulhões maçaricos reais

na vila onde eu moro
gente que diz bom dia sempre que escarra
extraída de dentro a cava maldição o soro
renovada a esperança na uva que cresce na parra

chilreiam andorinhas, pardais grasnam gaivotas
melros estorninhos pintassilgos voos rasantes
nas Primaveras memória dos ninhos em suas rotas
exultam ao sol emplumados em ritos amantes

o rio de águas mutantes e densa corrente
atravessa vilas cidades estreita rasga montanhas
chegado ao mar estanca no estuário laxante
trocam-se de amores ressuscitam vidas estranhas

na vila onde eu moro
há um tudo e um nada que apetece viver
cada alma é de senso comum um justo foro
onde a vida e a morte se adiam ao escurecer

autor:JRG

04/10/2009

CAÍU A MÁSCARA AO SENHOR PRESIDENTE DA MADEIRA

Caiu a máscara que restava ao senhor da Madeira. E não se pense que tal se deve a uma consistente afirmação por outros valores, mais soltos na defesa dos interesses reais da região, como seja a difusão da cultura, a progressão do ensino, a evidência como povo que pensa e decide pela sua própria cabeça, não! Como disse um sábio estratega politico do século XX, Mao Tsé Tung, "uma faúlha pode incendiar a pradaria", assim, um movimento de opinião, infimamente minoritário, entre a população regional, usando uma estratégia de gota a gota, de incómodo persistente pela sombra, o gesto mudo, a fixação na realidade oculta, fez extravasar o pouco de decoro face à violência efectiva que vinha caracterizando o discurso e a postura do senhor presidente da Madeira.

Ninguém é insensível ao riso que provoca um balão, um dirigível, sobre as cabeças concentradas na figura e no discurso do senhor presidente da Madeira.

Ninguém é insensível à presença dum carro funerário, ao redor dos fiéis que de uma qualquer forma, não sei qual, que magia, que feitiço, se juntam para prestar vassalagem ao senhor presidente da Madeira.

Ninguém é insensível ao movimento de pessoas com objectivas na mão, que lhe fixam a imagem, o ódio a transparecer nas bochechas coradas, vá lá saber-se de quê, o sangue da ira?!...O medo da descoberta, da nudez dos princípios, da falácia das palavras ante a evidência de uma realidade cada vez mais loquaz.

E é então que, imponente na sua arrogância de mandador sem lei, ferido na sua impotência ante a minoria silenciosa que ousa afrontá-lo no seu próprio reino, o senhor presidente da Madeira, inchado como um sapo prestes a explodir, incita a populaça, já que as policias não podem fazer nada, porque são a lei do Continente, já que Deus o abandonou nesta Santa Cruzada pelo bem estar do bom povo da Madeira, é hora de o povo agir, de fazer justiça pelas próprias mãos!...

E o inevitável aconteceu, ou ia acontecendo, mas fica a previsão de que pode acontecer numa ocasião mais favorável...

Perante os incidentes que vieram nas noticias destes últimos dias, na região autónoma da Madeira e protagonizadas pelo seu Presidente, seria de esperar uma atitude do Senhor Presidente da República, repudiando as atitudes de incitamento à violência das populações, é anti-constitucional, na linha das suas preocupações com a segurança das instituições, mas o senhor presidente da República, "aos costumes disse nada" e segue a novela até que seja o tempo de deitar contas à vida.

Saúdo a coragem, a ousadia, o humor saudável, o atrevimento de afrontar a asfixia da Madeira, do Movimento da Nova Democracia, cujos princípios ideológicos não defendo, mas que considero um marco importante no despertar do povo da Madeira para a vergonha que é ser conotado com tal espécie de pessoas na orientação dos seus destinos.

autor: JRG