São 50 centímetros de gente, que se movimenta em pequenos gestos de abrir e fechar de mãos, esticar os pés, bocejar, caretas que querem talvez afugentar espíritos que procuram entrar na sua alma iniciada.
Emite sons que já são uma comunicação e olha-me nos olhos, um pouco estranho de mim, como quem quer inteirar-se do que sou, se sou, quem sou. Enterneço-me de o olhar, de o sentir e levanto-o nos meus braços, aconchego-o ao meu peito e ele deixa-se ficar. Aceitou-me. E é , somos, já, uma evidência um do outro
Coloco um dos meus dedos entre uma das suas mãos pequeninas, os dedos dele esguios, longos, e a mão fecha-se sobre o meu dedo, numa primeira saudação, a dizer que me aceita, que podemos vir a descobrir juntos outros caminhos...
Fecha os olhos e dorme enquanto lhe observo os pequenos movimentos com que procura fixar-se na vida. E relembro nele os meus filhos, os traços que se afirmam indeléveis, os lábios,o mexer dos lábios, o queixo saliente, mas sobretudo a expectativa do ser que irão sendo, que foram sendo e que são hoje e que ele, esta pequena parte de mim, irá ser, sendo, a cada momento.
Olho os seus cabelos negros e a penugem que o cobre nas partes visíveis do corpo. E penso que seria assim, talvez tivesse sido, quando tudo começou, e as crias nasciam num qualquer recanto da natureza. Os pelos como vestimenta única e universal de igualitarismo.
Chama-se Pedro e é, segundo as convenções que organizam as hierarquias da família, meu neto. Eu chamo-lhe uma parte de mim. Não é meu, não sou dele, somos uma ligação intemporal e imaterial da espécie.
Nasceste Escorpião, como a avó, e vais por certo saber amar e sofrer, e ganhar vencendo todas as barreiras.
Temos genes comuns e vamos provavelmente amar-nos como só nós sabemos amar.
Olho as tuas mãos que se fecham e se abrem, como se me quisesses dizer, desde já, recebo e dou, recebo e dou, ou dou e recebo, dou e recebo...E fico na dúvida em qual dos dois termos deverei iniciar-te...ou de cujo espírito já vens imbuído...
Os teus olhos miram-me de novo, franzes a testa , semi cerras os olhos, interrogas-me, interrogas-te. Quem és?... Quem sou?...E eu não tenho respostas, meu amor...
4 comentários:
É sempre bom vir aqui e apreciar a leitura destes teus textos.
Um abraço
...que bonito texto.
Longa vida ao pequeno Pedro...que cresça em generosidade e sabedoria..e que as suas mãos aprendam a dar sempre que for preciso.
Muitos parabéns*
Rui, enfronhei-me em múltiplos espaços, mesmo a nível pessoal, (mais um neto,mais participação) e deixei a casa hospitalidade.
Agradeço as tuas palavras.
Um abraço amigo
maria lobos.
Sinto a ternura das tuas palavras, o fascinio de ser mãe. E fico cativo do sentimento belo que te sublima.
Um beijinho amigo
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