02/11/2012

ARTIGO 21-OU O DIREITO DE RESISTÊNCIA





foto pública tirada da net
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ARTIGO 21-OU O DIREITO DE RESISTÊNCIA
I
sete biliões de pessoas
de súbito penso
e se for verdade que somos demais
que à revelia da ideia
esgotamos recursos em megalomanias de poder
solitários indiferentes à agonia
indiferentes aos apelos de crianças com mazelas
à aridez da terra à saturação
do ar e à poluição dos rios e dos mares
rendidos ao brilho da oirama
transferidos os medos para o poder de sermos capazes
de matar outros animais
libertos de deus e do diabo mas frágeis
perante a dor de morrer
no meu país dizem que vivemos acima do que podíamos
mas como é tal possível
se não crescemos em gente desde há décadas
quem cresceu foi a usura
os outros dizem que somos madraços
não fornicamos o suficiente
que somos um povo rebelde mas subserviente
II
no meu país havia uma ditadura
que nos exercitava a elevar o pensamento
ante uma guerra absurda
e a liberdade aprisionada em seu degredo
mas havia canções para resistir
e palavras que varavam todas as fronteiras
na rua ganhamos novo alento
organizamos a vida como a ideia dizia
ocupamos terras fábricas casas
algumas sem préstimo outras de grande valia
congelámos preços subimos salários
instalámos comissões de trabalho e de bairro
fomos adentro ensinando
os que sem alfabeto nem horizonte não entendiam
o nosso excesso foi confiar demais
na força doutros que também mentiam
deixamos sem rega que murchassem
as flores antes viçosas que sustentavam a raiz
porque dava trabalho se dava
pensar e refazer de base as nossas vidas
amolecemos a razão
III
sete biliões de pessoas
e um por cento de mentes criminosas
que se amparam comummente
à espera de se tornarem eminências imortais
perpetram a razia dos excessos
se escasseiam os recursos matem-se os velhos
confisque-se a água a energia
racionalize-se o ar a liberdade restaure-se o medo
instale-se o império do mal menor
em cada cabeça que resiste alimenta-se o caos
que desça a noite
que os dias sombrios amoleçam a coragem
rasguem-se os contratos
que consubstanciavam a cidadania
quebrem-se os tratados
e os convénios que à partida já estavam gastos
quem lidera agora são os eruditos
não os humanistas arautos de pensamentos altruístas
a hora é dos eruditos da razão pura
economicistas racionalistas analistas eméritos
que acusam os povos de gordura
*
IV
no meu país amonta-se o lixo
dentro dos homens de barrigas bem cheias
aumentam taxas e impostos
descem salários pensões e outros cuidados
mas o povo amanhece calado
que às vezes penso se há outros países dentro do meu
ilhas ou feudos auto-governados
que escapam à sanha dos governos d'assassinos
vivendo a coberto dos esforçados
de caminhar lento olhos tristes pregados no chão
sem alma possessos ou zombies
à espera à espera que sopre um vento ou caia geada
à espera tum tiro de partida
à espera que não seja preciso fazer nada
que os bandidos saltem o postigo
ou um surto de cólera uma investida sem rosto
os afugente para sítio distante
ou que cansados de roubar ou fartos enfim se demitam
mas tirá-los a ferros que dor
pode ser que os militares os valentes os heróis
e vão ficando pelos cantos
V
sete biliões de pessoas
uns esqueléticos afónicos outros obesos risonhos
acusando-se os do meio em desespero
mutuamente porque acicatados pela tragédia
traídos por prolongada indiferença
há quanto tempo não regas as flores que agora secam
franjas de insurrectos gritam
atiram petardos inofensivos que assustam crianças
será mesmo de verdade aquilo
de quererem reduzir pessoas para metade
um holocausto encomendado
para parecer coisa da natureza ou da alma imaterial
os velhos os inaptos os doentes crónicos
a esperança dos do meio sempre a saltitarem
a selecção dos que ficam dá jeito
e vão passando a ideia a confiança a cobiça cénica
aos que por inerência podem ficar
vejam bem dizem quanto podemos poupar
artistas ficam os truões amestrados
alguém que escreva comédias das mais hilariantes
nada de poetas nem romancistas
VI
no meu país havia até pensadores
e ideais de viver em paz com amor a tanta gente
gente solidária sem medo de perder
se a vida é um jogo perde-se e ganha-se sem deixar de vencer
é certo que havia quem se zangasse com a mulher
frustrado por não ousar trilhar seu próprio caminho
culpa do vinho dos instintos recalcados
ou do conceito de macho forjado na barbárie a violência
foi sempre assim e assim será dizem
como se os poderes não fossem sustentados pela cobardia
não há inocentes nem culpados
um homem frente a outro trocam olhares medem alturas
não quantificam a força de cada alma
ao invés da mulher que tantos barbaramente sacrificam
que tem na percepção um sexto sentido
será verdade que querem exterminar visceralmente
equilibrar a força ora emergente
que só assim haverá fartura para toda a gente imaginem
metade de tudo no consumo e usufruto
das coisas que ainda há e do que deixaram ficar
saúde habitação emprego educação
VII
sete biliões de pessoas
esquecidas de pensar dão asas ao pensamento
se o que cada usurário ganha
mais as marionetas do poder dá comida a muita gente
e logo renasce a boa esperança
invertem simplesmente a oratória fantasista
somos nós que os sustentamos
não são eles e seus sábios amestrados que nos sustentam
se formos cooperativos e amar-mos
a nossa condição humana se respeitarmos a natureza
se produzirmos tão só o que faz falta
se organizarmos a vida sem sofismas egoístas
se alterarmos o conceito de riqueza
se formos capazes de manter nossas mãos unidas por mais tempo
se respeitarmos as outras espécies animais
se não permitirmos que haja fome e maus tratos
se não tivermos medos
se mantivermos as diferenças sem quebrar os elos
que nos unem à vida e ao planeta
então seremos capazes de evitar o genocídio
que nos traz esta emergência...

autor: jrg

1 comentário:

Unknown disse...

O amigo acaba de fazer de forma poética uma exaltação ao "des Capital" de karl Marx, pois desnuda a exploração e consequente miséria internacional provocada pela apropriação da riqueza global por meia dúzia de grandes accionistas das grandes multinacionais!
De que precisam estes sete biliões de pessoas para se livrarem do ferrete do capitalismo que os marginaliza e condena à "escravidão" moderna de um capitalismo levado aos seus limites!