DECÁSTICOS DA ALMA (verso livre)
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I
EU
o homem a nu
o corpo a alma
sem deus
sem pátria
sem amo
faminto de amor
a despertar
dum sonho longo
há tantos milénios
acorrentado é o que sou
autor: jrg
II
MEDO
quanto de mim de ti
é segredo oculto
por mais que
me e te aprofundes
me e te arrojes
me e te exponhas ao risco
que grite me grites
somos o resultado agreste
de mutações paranormais
paz e guerra palavras é o que sou...és
autor: jrg
III
AGUARELA!...
pinto o teu retrato
a tinta desmaiada d'aguarela
fixo os olhos
a sensualidade dos lábios
o sorriso de mil cores
e pinto a sombra da alma
que adeja algo perdida
sobre um feixe de luz
a tua sombra
emboscada no eclipse lunar
autor jrg
IV
A DANÇA...
ao toque de Ravel
imponente e mágico
o teu corpo se cola no meu
e juntos num rodopio
fantástico dentro do bolero
lançados ao desafio
fazemos amor...
na subida retumbante
dos sons afrodisíacos
que nos ateiam o desejo
autor:jrg
V
JOGADOR
vou a jogo
porque te amo
e o amor se joga
em cada vasa
quando te percorro
o corpo e subo ao pico
no cimo dos mamilos
ardilosos
e nos lábios acendo o fogo
da tua acha
autor:jrg
VI
SURPRESA
hoje trago-te flores
e a lembrança do mar
visto do alto
de onde tantas vezes
nascemos
no ocaso do sol
de lábios colados
à esperança...
e subimos às estrelas
por onde a lua se esgueira
auto:jrg
VII
CANGACEIRO
vivo na mata
vagabundo desnaturado
trago na veia o fardo
de criança sem amor
amo o fusil a faca
presto serviço fatal
não me peçam consciência
nem o cangaço é meu mal
tenho amor à natureza
sou nela um homem normal
autor: jrg
VIII
ASSALTO
a bolsa ou a vida
se dou a bolsa
me matam
se não dou
matam também
mais vale que a morte
se vingue
lutando p'ela vida de alguém
se tiver sorte
não morrerei por nada
autor: jrg
IX
METAMORFOSE
borboleta de cores garridas
pousada em pétala sagrada
trazes sonhos coloridos
levas nossos pesadelos
dúctil tão leve escondes segredos
leva a minha alma alada
no silêncio de alaridos
em que escondo os meus medos
ao ver-te assim destemida
nas arestas dos penedos
autor: jrg
X
AMAR
amo o doce dos teus olhos
todo eu me estremeço
quando os teus lábios beijo
e sinto que te aconteço
no amarinhar do desejo
não sei de nada enlouqueço
no fogo ardente que vejo
e me volta do avesso
quando já sinto o cortejo
das fantasias que teço
autor: jrg
XI
LIBERTINO
sulco a noite
na madrugada orvalhada
de bar em bar sem palavras
vapores de alucinação
corpos suados de fêmeas
na invenção de prazeres
bebo copos fumo cigarros
na boémia faço sexo
nos recantos sombreados
sob gemidos possessos
autor: jrg
XII
SEXO
há um coração
dentro do teu sexo
de lábios húmidos excitados
em excitantes apelos
que partem do corpo para a alma
e se agitam nos toques
fermentados na libido
por fantasias desejos almejos
de explosivos prazeres
breves absolutos
autor: jrg
XIII
TRABALHO
não sendo um fardo
que oprima a dignidade
nem a alegria mórbida tapa luzes
trabalho é o lazer da consciência
o orgulho de vencer
socalcos de desenvolvimento
sem aturar a diferenças
espartilhos de enlouquecer
que cultivam o medo
e cortam no crescimento
autor: jrg
XIV
NOVA HUMANIDADE
podia ser
a extorsão do medo
a decadência do ódio
o fim do preconceito
entre flores
negras de fuligem
que anunciam
o fim do machismo
a idade cósmica
a explosão feminina do amor
jrg
XV
A SABEDORIA
a intensidade luz
sobre a evidência feroz da treva
o olho vivo
a prostração meditativa
a serenidade do consciente
o olhar cósmico
o todo em tons de sonhos ávidos
que assaltam a inquietude
da alma humana
mulher ciência idade nova
jrg
XVI
PÁTRIA OU MÁTRIA
a alma humana de mulher
é mãe de toda a criatura
porque havia de ser ao homem concedido
por quem com que propósito
o direito de humilhar
traçando a rota o rumo sem destino
trazendo agrilhoada na mentira
aquela que é maior
que está para além da vida eterna
Mátria mãe da humanidade
jrg
XVII
O CAPITAL
foi sempre fruto da pilhagem
da dádiva por conquista
da força que vence o medo quando ataca
nasceu do nada ter e por cobiça
quando o ser não era tido em conta
usurpou terras as mais ricas
amealhou ouro tornado metal raro precioso
confiscou por livre arbítrio
o homem e a natureza
inventou um novo deus para sua protecção
jrg
XVIII
A RELIGIÃO
o homem é o ser mais fraco
em toda a natureza
se o abandonarem quando nasce
morre de frio de fome ou medo
desde cedo que elege mitos protectores
com ligações ao vento e às estrelas
inventou deuses por ramo de actividade
até que alguém mais erudito
lhe ofereceu a protecção real e a divina
a troco de os servir sem resistência
jrg
XIX
POLITICA
hoje que o homem se libertou do medo
que em amplas partes do mundo
se travam combates
contra oligarquias obsoletas
hoje que a ideia de deus
já não protege as politicas arbitrárias
e se desmistificam heranças messiânicas
está aberto o caminho da luz
hoje em cada canto do mundo
mulheres despertam para a sua consciência
jrg
XX
DA FILOSOFIA
se o homem em si mesmo
é um produto orgânico da natureza
que gira como um pião
e rodopia à volta de estrela maior
suspensa entre gazes em fusão
memórias cósmicas que não usa
e vilipendia a sua origem
usando estratagemas de linhagem
então o homem não existe
autor: jrg
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